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sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Manifesto viajante

O que eu quero não está na televisão e não há publicidade que possa me entreter – sequer a dou ouvidos.
O que eu quero só se pode sentir em movimento.
Nas idas sem voltas de novos caminhos, no ineditismo de boas caminhadas ou nas janelas que me oferecem vistas cintilantes.
O que quero só se pode sentir no silêncio incomunicável de um pôr do Sol que – posso jurar – não há câmera que o reproduza.
O que eu quero é presenciar a liberdade de me sentir tão solto e perdido, em meio a pessoas que não conheço, paisagens que não estou acostumado e climas que me são estranhos.
O que eu quero é sentir novamente a carência de rigores, que me desconecta de preconceitos e padrões, que me permite ser a versão mais sincera de mim.
O que eu quero é deixar meu olhar curioso.
Sorrir com espontaneidade, sentir minha sobrancelha arquear-se e desembrulhar cada minuto do meu dia como se fossem cartas embaralhadas pelo destino.
O que eu quero só se pode sentir na condição de carona – é quando o que estava rápido desacelera, uma porta se abre e o resto não mais importa.
Compartilhar momentos memoráveis com pessoas de outros países, continentes e realidades. Quando não descobrimos novas aventuras, descobrimos a nós mesmos. Ser diplomata da vida.
O que eu quero só se pode sentir depois de conversar horas com estranhos, beber novas culturas e brindar com novas palavras. Grandes amizades nascem assim. E amores também.
O que eu quero é aprender novas línguas – não para falar, mas para ouvir mais. Mergulhar em novos conhecimentos, sobrevoar novas religiões e pescar novos sentidos que me façam dar, à vida, uma chuva de significados.
O que eu quero…
O que eu quero só se pode sentir depois de percorrer estradas sem nenhum turista, subir montanhas com lendas locais e descobrir que tudo, na verdade, é especialmente único e perfeito. É descobrir que onde poucos chegam, muitos se encontram.
O que eu quero só se pode sentir depois de dormir em diferentes lugares e acordar olhando para tantos outros tetos. Ou às vezes estrelas – desprender-me: a liberdade de não pertencer a nada me permite, potencialmente, pertencer a tudo.
O que eu quero é silêncio.
Um momento presente de paz; e me conhecer. Gritar para o mundo que sou seu filho e escutar meu chamado ecoar, sem barreiras, até perder-se.
O que eu quero é ir mais longe, sentir o vento redesenhar meu rosto e ser contemplado com uma paisagem que me faça tirar os meus óculos escuros.
O que eu quero só se pode sentir quando o coração é a bússola. Das bandeiras que capitaneia minha alma; do sangue de explorador que desvirgina minhas veias – a livre e amaldiçoada necessidade de lograr novos horizontes.
O que eu quero viola preconceitos, visões pequenas e raízes profundas. À qualquer julgamento prevaleço calado. E sigo.
O que eu quero é viajar; mas viajar de verdade, com verdade e por novas verdades. Despir-me de fronteiras e rotas – ser um sopro de vento entre árvores. Tão livre e tão cativante.
O que eu quero, mesmo, é olhar para frente e saber que amanhã estarei lá.
(Marcelo Penteado)

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